Medidas técnicas de geoengenharia
Ao contrário do que se
poderia pensar, algumas das ideias de geoengenharia surgiram em 1965 quando um
grupo de cientistas apresentou ao então presidente dos Estados Unidos da América
Lyndon B. Johnson, um relatório sobre o aumento das emissões de CO2,
devidas ao aumento da queima de combustíveis fósseis, e onde se alertava para a
possibilidade de estes virem a produzir alterações climáticas. Na altura, não
foi sequer sugerido que essas emissões fossem reduzidas mas foi apresentado um
projeto (curiosamente hoje sabe-se que nunca funcionaria), que constava de
espalhar partículas refletoras em cerca de 13 milhões de metros quadrados de
oceano, de modo a que 1% da radiação solar fosse refletida [9]. Desde então têm
surgido muitas outras ideias que têm sido um pouco postas de parte pela maioria
dos ambientalistas e cientistas, por considerarem que estas evitam a raiz do
problema que deveria ser a diminuição do volume de emissões de CO2. Mais recentemente, mercê de alguns projetos inovadores que têm sido apresentados, a geoengenharia tem voltado à ordem do dia.
problema que deveria ser a diminuição do volume de emissões de CO2. Mais recentemente, mercê de alguns projetos inovadores que têm sido apresentados, a geoengenharia tem voltado à ordem do dia.
Existem basicamente
duas categorias de métodos de geoengenharia: as técnicas de remoção de CO2
da atmosfera e as técnicas baseadas na reflexão da radiação solar. [1]
As técnicas de remoção
de CO2 da atmosfera são consideradas as menos perigosas e mais
aconselháveis, por atacarem a raiz do problema do aquecimento global e por
apresentarem menos incertezas e riscos. No entanto, apresentam a desvantagem de
demorarem muito tempo a produzir o efeito do abaixamento de temperatura. Nesta
categoria refira-se como exemplos:
- A captação e
armazenagem do dióxido de carbono em camadas subterrâneas do solo ou do fundo
do mar, de modo a que o seu efeito na atmosfera deixe de se fazer sentir.
- Espalhamento de
núcleos de ferro no oceano com o objetivo de servir de base de desenvolvimento
para o fitoplâncton que posteriormente irá absorver o excesso de dióxido de
carbono. Outra variante é a captação do CO2 por cianobactérias
colocadas em zonas próprias do mar, com esse propósito.
- Substituição do ácido
clorídrico por ácido carbónico, no oceano. Tal vai acelerar o processo segundo
o qual o dióxido de carbono é absorvido e armazenado naturalmente nos oceanos,
como parte do processo do ciclo do carbono.
- Plantação de floresta
que, através da fotossíntese, irá remover o excesso de dióxido de carbono,
sendo que a desflorestação é um dos principais motivos pelos quais o dióxido de
carbono se foi acumulando na atmosfera.
- Transformação do
dióxido de carbono em combustível através do da utilização de nanopartículas de
ouro como catalisador, que convertem o dióxido de carbono em monóxido de
carbono o qual pode ser usado como combustível alternativo [11].
- As técnicas baseadas
na reflexão da radiação solar têm como principal objetivo refletir uma pequena
parte da radiação solar que atinge a atmosfera, de volta para o espaço. Estas
práticas têm como vantagem produzirem efeitos rápidos embora não tratem a causa
do problema e por isso se considere possam vir a trazer consequências nefastas,
nomeadamente no que se refere à acidificação dos oceanos. São exemplos destas
técnicas:
- A injeção de aerossol
(de químicos como o sulfato ou de vapor de água) na estratosfera de modo que as
gotículas reflitam uma parte da radiação. Considera-se que este método pode
refletir até 8% da radiação que atinge a estratosfera terrestre, à semelhança
do que aconteceu quando o vulcão do monte de Pinatubo nas Filipinas produziu
uma erupção piroclástica lançando tal quantidade de cinzas na atmosfera que
causou um arrefecimento sensível à escala global.
- Lançamento de discos,
escudos ou partículas refletoras para a órbita terrestre que se pensa serem
capazes de refletir radiação suficiente para que a temperatura arrefeça
sensivelmente.
- Pintar os telhados de
branco também poderia refletir uma parte da radiação solar para a atmosfera
embora seja a técnica considerada a menos credível.
Reflexão
sobre a ética subjacente às medidas técnicas
Podemos considerar que
todas as medidas de geoengenharia referidas são medidas de mitigação, pois
tratam de minimizar as consequências do excesso de queima de combustíveis
fósseis tendo por detrás delas uma perspetiva utilitarista, especialmente se
pensarmos no carater holístico e consequencialista das mesmas, privilegiando o
todo em detrimento de cada indivíduo e as consequências mais do que as ações.
Por outro lado, pode
considerar-se que o seu carater biocêntrico se sobrepõe ao antropocêntrico. O
seu desenvolvimento deveu-se à preocupação com as gerações futuras (bem como
com as atuais) de seres humanos mas também de todos os seres vivos e não vivos
da bioesfera. Na implementação destas medidas não será difícil determinar de
quem será a responsabilidade moral dos custos económicos das implementações
(dos países mais industrializados, logo os mais poluidores). Mais difícil será
controlar as consequências visto que uma política de tentativa e erro está fora
de questão. Já em relação ao PNAC, parece claro que a ideologia predominante é
o antropocentrismo, visto ter inerente uma preocupação não com a preservação da
biosfera em si, mas sim com a manutenção da qualidade de vida do homem.
Consequências
técnicas e éticas das medidas de geoengenharia
As consequências da
implementação das técnicas de geoengenharia mais referidas na literatura,
embora tenham sido estudadas à escala laboratorial são, na maioria dos casos,
imprevisíveis, quando aplicadas a larga escala. Daí que alguns membros da
comunidade científica se insurjam contra elas, apontado várias razões tais como
[13]: efeitos indesejados nos climas regionais (p. ex. alterações nas monções);
aumento da acidificação do oceano que pode levar, por exemplo, à dissolução de
corais; aumento da quantidade total de ácidos que atingem o solo; alterações
nos comportamentos dos vegetais por alteração da insolação; menos insolação
disponível para ser utilizada em colectores solares e outras formas limpas de
obter energia elétrica; possibilidade de haver conflitos entre países para
controlarem a tecnologia ou aproveitamento militar da mesma; dificuldades de
controlo termostático; dificuldades na escolha de quem controla a tecnologia
(que governos ou Nações Unidas?) e quem beneficia economicamente com as
medidas; problemas éticos e morais. Desde já se pode prever que existem sérias
questões éticas a considerar dado que os testes laboratoriais revelam que os
riscos e benefícios da implementação dos projetos de geoengenharia
implementados a larga escala, não só são difíceis de prever, como também terão
uma distribuição desigual. É portanto importante
estabelecer quais os possíveis cenários para poder fazer juízos de valor.
No caso de as tecnologias serem implementadas
e todos os afetados saírem favorecidos, não haveria qualquer dúvida em decidir
que se deveriam implementá-las, caso contrário começaria a haver dilemas éticos
e morais na tomada de decisão de implementação. Basta que uma pequena
comunidade seja prejudicada (por exemplo se tiver de ser relocalizada) para que
surja o dilema ético na decisão: será que se deve tomar a decisão de fazer o
que é melhor para um maior número de pessoas, em detrimento da preservação de
pequenas comunidades, seguindo a ideologia utilitarista; ou será que cada
comunidade tem um valor em si, cujos interesses devem ser acautelados?
Outra questão que se
coloca está relacionada com o facto de se poder pensar que, dado que já existem
medidas técnicas para resolver a questão do excesso de gases com efeitos de
estufa, as pessoas poderem pensar que são livres de produzir a quantidade de
gases que lhes é mais conveniente sem pensarem nas respetivas consequências.
Política
ambiental
Em termos de política
ambiental existe uma série de princípios básicos [14], dos quais se devem
salientar os seguintes: o princípio da precaução, segundo o qual as incertezas
sobre as consequências de uma ocorrência a nível ambiental, não devem ser
impeditivas de se tomarem decisões sobre as causas dessa ocorrência; o
princípio da prevenção, que preconiza que se devem tomar medidas que visem
evitar ou minimizar danos ambientais; o princípio de poluidor-pagador visa
prevenir, atribuir os danos e repará-los, no caso de estes já terem ocorrido; o
princípio da integração tem como fim a integração de princípios de
sustentabilidade em todos os projetos. A aplicação destas políticas tem-se
revelado difícil de concretizar embora se encontrem claramente referidos ou
apenas subjacentes, em muitos acordos internacionais e/ou diretivas da União
Europeia. São exemplos disso a menção do princípio da precaução no Tratado de
Maastricht, em 1992, ou o facto do princípio do poluidor pagador aparecer como
um dos princípios fundadores da política ambiental no Primeiro Programa de
Ação, em 1973 [14].
No que diz respeito à
questão política, Robock (2006) advoga no seu artigo “20 reasons why
geoengeneering may be a bad idea” [12] a seguinte tese: “se o aquecimento
global é um problema político, não há soluções técnicas que o resolvam”,
referindo-se aos biliões de dólares com que as indústrias do carvão, petróleo,
gás e energia nuclear são subsidiadas, nos Estados Unidos, em detrimento das
energias alternativas como a solar e eólica que poderiam ser a solução para as
necessidades energéticas do país. O mesmo autor também menciona o facto de o
governo federal impedir as tentativas de os estados regulamentarem redução da
emissão de gases e deixa uma advertência para o perigo que representa a
influência antropogénica deliberada no sistema climático global.
Anne
Nogueira 26/01/2014
- [1]Biello, David – What is geoengeneerig and why is it considered climate change solution – Scientific American [Em linha]. Abril 2010 [ Consult. 9/2/2012]. Disponível em: http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=geoengineering-and-climate-change
- [7] Jamieson, Dale - Ethics and intentional climate change Climatic Change [Em linha], nº 33 p. 323-336 (1996) [Consult.13/2/2012] Disponível em: http://steinhardt.nyu.edu/scmsAdmin/uploads/000/474/1.pdf
- [8] Jamieson, Dale – Manual de Filosofia do Ambiente, Lisboa: Instituto Piaget, Coleção Perspetivas Ecológicas (2005) ISBN 972-771-772-1
- [9]Kunzig, Robert – Geoengeneering: how to cool Earth--At a price. Scientific American [Em linha]. Novembro 2008. [Consult. 9/2/2012] . Disponível em: http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=geoengineering-how-to-cool-earth ,
- [10] Martin, James – The ethics of geoengeneering. Geoengeneering ethics working group [Consult. 14/2/2012] Disponível em: http://www.practicalethics.ox.ac.uk/__data/assets/pdf_file/0013/21325/Ethics_of_Geoengineering_Working_Draft.pdf
- [11] Mendonça, J.E., 2013, Ouro pode transformar CO2 em substâncias úteis, Planeta Sustentável. Disponível em http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/planeta-urgente/ouro-pode-tansformar-co2-em-substancias-uteis/. Consultado em 26/01/2013
- [12]Portal do Ambiente - Agência Portuguesa do Ambiente, Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional .[Consult. 13/2/2012]. Disponível em: http://www.iambiente.pt/portal/page?_pageid=73,408080&_dad=portal&_schema=PORTAL&actualmenu=10141055&docs=10138660&cboui=10138660 ,
- [13] Robock, Alan – 20 Reasons why geoengeneering may be a bad idea. The Bulletin (2006).[Em linha] vol. 64, nº 2, p. 14-18 [Consult. 13/2/2012] Disponível em: http://www.thebulletin.org/files/064002006_0.pdf
- [14]Vaz, S.G., Delfino,A., Manual de Ética Ambiental, Lisboa: Universidade Aberta (2010) ISBN 978-972-674-671-3
Sem comentários:
Enviar um comentário
Deixe a sua opinião critica e construtiva.
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.